terça-feira, 29 de outubro de 2013

Fedor de presidente

Nos tempos modernos o pensamento dos presidentes de grandes corporações, diária e insistentemente, fede. A mim me parece pior justo pela motivação. Ao que parece são apenas idiotas fracassados cujo único sucesso na mediocridade de suas existências é roubar as possibilidades de uma vida de relações pessoais, humanas, quentes, das gerações mais novas. Oferecem telas brilhosas para crianças e em troca roubam sua vitalidade utilizando-se do pior que há no marketing. E os profissionais de marketing, será que todos ainda acreditam que esse problema não é seu, que a ética das corporações para quem por míseros trocados trabalham não lhes diz respeito? Às vezes lembro dos estagiários babando ovos e atualmente também babando seios para galgar um carguinho na diretoria. Tantas pessoas caindo nos velhos truques onde frustrados vendem pensamentos mofados nas suas palestras motivacionais, travestem a falta de criatividade com novos termos, tipo coach... Pena utilizarem pensamentos válidos abastecidos com muita idiotice, validam a miséria de suas mentes com citações fora de contexto, sofistas no pior do termo usam a dialética como arma de convencimento e não como alavanca para o conhecimento. O pensamento moderno dos presidentes das grandes corporações, diária e insistentemente, fede.

domingo, 22 de setembro de 2013

Meudoxo

Sei que quanto mais me afasto da alegria comprada nos comerciais, mais me afasto das pessoas que gosto, considero, amo, convivo. Ao passo que sonho a intimidade advinda do íntimo, opositora da intimidade vida do shopping, troco a cumplicidade das compras pela dificuldade dos seres. Perco intimidades no mundo dos estereótipos. Assim sou menos coletivo mesmo quando quero ser mais plural. Fazer o quê? Sou dado a me relacionar com almas.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

O pão de mãe

Pra ver como é a vida. Havia na minha mesa, dois pães, aqueles de fazer cachorro quente. Nem sou fã deles, mas compro. Fritei um filezinho de frango que a namorada trouxe, temperei com um tempero urugauio, misturei três salsichas em rodelas, sou chique, parti os pães e comi como um padre. Mas ser humano satisfeito é ser humano insatisfeito. Assim, apreciando a chuvarada com raios atropelando o ar parado, pensava na falta que um pãozinho estaria por fazer mais tarde, quando levantasse da rede para um café com leite. Toc, toc... Entra aí Nardo, tranquilo? Sim, é que eu vim da casa da minha mãe e ela me deu muito pão, te trouxe um pedaço. Agora cá estou, a comer pão de mãe, deitado na rede, a chuva caindo e zzzzz...

Anarquismo reacionário


O anarquismo que não é bagunça e sim a soma de movimentos individuais e independentes parece enfim ter encontrado uma forma para se manifestar com efetividade. Era um conhecido que estava completamente desacreditado, estava. Pelo condão pejorativo do termo, muitos ainda enxergam em si o sujeito reacionário que viam, mas já não se reconhecem tanto assim.
Hoje o Brasil é um país politicamente tão cheio de 'anarquistas' quanto o miserável e comercial futebol brasileiro é cheio de técnicos, juízes e lavagem de dinheiro. A diferença clara está no que antes parecia obscuro. O anarquismo, figura que historicamente trouxe o medo de um descontrole social, agora é justamente o elemento que garante ao manifestante de rua tuiteiro, a dona de casa feicebuquiana, ao gerente baba-ovos leitor de jornal, ao militante partidário engajado nas compras coletivas o escudo que não tinham para lhes polir a coragem. O anarquismo trouxe a preservação da identidade. Estamos indo bem, basta continuar.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A resiliência e a prática de amar

Nesse tamanho que tenho ao peito
frente ao mundo que me veste
sinto o sonho de preencher quereres
além do que me consterna

Nesse caminhar lento de onde venho
a cada dia venço um teste
quando aceito receber dos passos dados
menos do que alcançou a perna

Nesse viver que amanhã intento
por ter no peito esse tamanho
darei hoje mais um passo para o sonho
mesmo aquém do que a boca encerra

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Distribuindo riquezas


A manhã havia começado há pouco, poucos carros estacionados no centro da cidade, cidade ainda com cara de pacata. Quis chegar ao escritório central bem cedo, queria sair bem cedo. A lancha recém adquirida no último salão náutico estava pronta para o batismo no mar. Nem bem avistei o prédio da empresa, ainda muitos quarteirões da vaga particularmente reservada a diretoria, o Jaguar simplesmente parou. Uma pane. Se fosse na hora do rush encontraria um inferno de buzinas lá fora. Chovia tão intensamente quanto falsas cuecas inocentes numa sessão de julgamento do mensalão. Pude deixar que o carro seguisse sem marcha pelo declive até encontrar espaço, a essas horas abundante, na beira da calçada.
O socorro do seguro avisou que socorrer mesmo, só mais tarde. Olhei e vi uma pequena porta aberta, aberta mas fechada, só não estava trancada e eu sabia que estava aberta porque era de vidro e havia luz acessa dentro, com gente. Quem trabalha cedo assim merece receber sua cota de riqueza, cota de riqueza que tenho para distribuir. A troco de dar pensei no que receber, um café. Desci, me molhei na água da chuva, chuva abundante. Molhado entrei no café e pedi um, sem açúcar, sem leite, grande. Bebi o café e comi bolo, um pedaço grande dele. Carro pifado, chovendo, num café pequeno, simples, pobre. A chuva não sabia de nós, em si mesma apenas chovia. O casaco que ficou no carro também não sabia de mim, eu que com o desconforto do frio, de leve, tremia. A blusa fina estampa e leve que trouxe no corpo estava úmida, fria. O balcão, indiretamente pelo café, diretamente pela cafeteira e sua caldeira, protegia um pouco do frio de fora quem estivesse por dentro. O casaco dela servia menos a ela do que alguém de fora. Sua riqueza no dia frio era, também, o calor.
Ela tão pobre. Eu tão rico. Por fim despi minha riqueza. Já um tanto aquecido pelo café descobri ser ela quem distribuía. Deu-me o calor.

domingo, 21 de julho de 2013

Foi assim

Um cara estava com fome, viu um negócio, partiu e comeu. Era uma porcaria. Catou outro, partiu, cozinhou e comeu. Era horrível mesmo. Olhou na etiqueta do negócio e leu uma mensagem infernal. Naquele momento o universo brecou nas quatro, a coisa tinha nome. O cara enfiou o dedo na garganta e vomitando agarrado a tudo quanto é capim próximo, imaginou o fundo da terra com um ser muito sádico e gritou:
- Pra criar isso só pode ter sido um demônio!
Chegou em casa e contou para a mulher que ainda estava lá e naquele momento, dona de si, escrevia numa plaqueta 'adeus sutiã'. Como o babado parecia ser quente ela arriscou continuar a relação por mais um ciclo até a próxima TPM, mandou que repetisse a notícia. Disse ele:
- Comi um negócio criado pelo demônio.
Ela não conseguiu compreender a subliminaridade do conto pois não havia contraponto. Então o orelhudo tentou ser mais convincente.
- É que um cara muito legal resolveu fazer esse mundão todo aqui, com laranjas, mangas, mamões, cupuaçus, pitangas... por isso chamamos esse lugar de mundão de meu deus. Um descendente dele, nascido dos longos cabelos brancos super-escovados com luzes e sem pontas duplas, por ter nascido com um maquiavélico cabelo loiro, lisinho penteado pro ladinho, vendo que tudo já estava perfeitamente criado, ficou puto. Um dia fugiu com uma nuvem de caspa enquanto deus penteava seus longos cabelos brancos super-escovados com luzes e sem pontas duplas. O loirinho endemoniado jurou amargar eternamente cada estrutura bípede ereta com polegar opositor e terrestre que fosse criatura do criador. Entocou-se numa fundição, chamou de inferno e inventou o Jiló.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Eterea trela

Há de soprar uma brisa
Qualquer força tenha ela
Desde que ela seja a tua
E que me invada a janela

quinta-feira, 4 de julho de 2013

O que é a vida?

Nesses meus anos por aqui, nesse universo pequeno que vai do alcance das vistas até o ar que vira vento em meus pulmões, compreender o que é esse diuturno existir me desocupa o tempo vago. Singular como o coletivo, às vezes paro e penso, esse exercício não remunerado que motiva... cheguei a crer, talvez outra vez comum como todo ser saindo do verde sem saber se apodrece antes de estar maduro, que os motivos em ação cobririam esse estar com tempo e espaço num acidental existir.
Motivações para viver são fáceis de encontrar, existem a cada farfalhar ou cheiro de rosa, surgem mesmo quando queremos ser cinzas. Então, no rascunhar da minha tese, a motivação correu logo para o capítulo dos complementos cotidianos, importantes é claro, deixando vaga a enciclopédia que expande a compreensão, humana, do exercício existir. Vontade, desejo, ambição, perversão, fraqueza, covardia, amor, medo, paixão, tesão, desespero, inspiração, transpiração, carinho, caridade, compaixão... e quase todo um dicionário pode ser citado como termo motivador. Até vendedores de carnê usam eles. Indubitável companheira do viver, da angústia por hoje não digo, paro nesta linha em que a cito. As motivações são amorais, grafando de outra forma, servem morais de qualquer ordem. Porém, existir é transitar entre esses conceitos com algo que os precede, sucede, incorpora, sublima. Há algo puro.
Um dia relendo rabiscos entre o papéis amassados dos conselhos sem destino certo, encontrei uma biblioteca de uma fala só. Foi a palavra mais forte que bebi em toda existência, inclusive a dos imaginários lidos. Entusiasmo. Anotado em rodapé lia-se: Alimenta-se da esperança e é tônico para o sorriso, reconhecidamente o mais poderoso dos remédios. Se me perguntassem hoje o que é a vida, responderia tácito, entusiasmo. Tenho muito respeito por ele, quando me desespero procuro ganhar tempo para respirar e vasculhar a prateleira dos livros pouco lidos, a fim de reencontrá-lo. Um dia esqueci disto, ou ainda não sabia, sem bem me perceber passei a borracha no bloco de anotações vitais, justamente onde estava escrito entusiasmo e, sem fazer vento, morri.

terça-feira, 2 de julho de 2013

Quanticando

Estou quase a ponto de escolher algo que sábios, supostos, dizem ser uma escolha no mínimo inteligente. Como já dizia o bom e velho Shakespeare, supostamente, um dia aprendemos que por mais que a gente se importe, algumas pessoas simplesmente não se importam. A tribo do Rock, suponho, levanta o dedo do meio, gira a mão em quase punho serrado, faz cara de Einstein e manda um eloquente 'foda-se' quando alguém desdenha das suas importâncias. As funkeiras, supõem-se, viram a bunda e mexem, resumem-se a uma bunda quando desimportam do que querem de si.
Danço com demasiada elegância para me reduzir a uma bunda. Raciocino lento demais para eloquência de uma língua de fora e sou muito provinciano para andar com o dedo em riste. Ainda, dou exagerado crédito aos créditos dos outros para seguir o conselho do William. Por essas e outras que sou gerúndio, sou a ponto de... Um átimo destes faço a curva, dou a volta, salto como elétron, deixo de apenas estar a ponto de escolher deixar de sofrer.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Por querer


Não consigo escrever poesias em dias óbvios.
Na prosa dos óbvios não há poética.
Na poesias, de óbvio, só o caráter de não sê-lo.
Não consigo sê-lo, poético, no sintético.

Assim devem seguir me varrendo a alma
O incerto, o profano, o eclético
Num perder diário sem socorro
Onde te amar é o cessar do hermético.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Divina humildade

E então aquela mulher espiritualmente evoluída, aquele ser que compreendeu e venceu o jogo da vida, o Samsara, olhou para seu hermético deus uno e trino, o que vive dentro de si, afinal o lugar perfeito que ela criou para que seu deus fosse luz. Enternecida com seu sofrimento e resiliência para atingir esse privilégio de ser tão humilde a ponto de prostrar-se de joelhos sobre uma simples almofada de veludo e não de uma ostensiva seda javanesa, seu coração elevado ao alto e certamente mais puro que todos esses outros corações sem o seu deus, talvez mesmo por falta de acesso, esses impuros com quem ela se vê obrigada a conviver e quase se contaminar diariamente, suspira e devotamente modesta agradece a sua luminosa e justa superioridade evolutiva. Depois manda a copeira servir o chá para as amigas que vieram lhe visitar a fim de saber mais sobre sua última viagem ao Tibet, onde adquiriu, mais por caridade que por gosto e, naturalmente por uma bagatela, algumas relíquias a fim de auxiliar artesãos muito pobres que construíram um templo muito simples, mas limpo, nos arredores do hotel seis estrelas que ela se hospedou por três semanas antes de se instalar por seis meses no mosteiro, o mais chique do Tibet, para exercitar o desprendimento material.

sexta-feira, 31 de maio de 2013

Quando a vida acelera

contou mais um dia hoje
conta o ano próximo
soma a idade nova
vinte e sete será vinte e oito
vai de perto ver o ano que vem
deixa para trás o ano que é hoje
pensa
calcula o que está suspenso
retorna ao que sonhou
movimenta o corpo frenética
quer retroceder o dia que contou hoje
faz do que ainda não veio algo que possa ser já
um passado
afinal
que velocidade é esta?
é você quem anda depressa
ou serei eu a perder o teu tempo?

(já publicado como: !aniversários por hora?)

terça-feira, 28 de maio de 2013

as verdades no além das minhas

Há muito mais do que poderia imaginar
em viver.
E passa a manhã e passa a tarde e passa a noite e soma tudo
e houve mais do que imaginava.

Imagens, muitas.

Todo ontem que chega tem sido assim.Traz desconforto e também curiosidade
do que não virá.
Incógnitas às vezes parecem certezas, mas geralmente são dúvidas mesmo
e elas são mais do que consigo responder.

Palavras, muitas.

Paradoxal é sentir que dar o benefício da dúvida ao futuro traz mais tranquilidade
no passado.
Pensamentos, é este o avolumado que surge
nestes intervalos.

Ideias, poucas.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Triste paradigma.

Mesmo diariamente mais calejado me assombro, também diariamente, com o poder que o conceito abstrato de possuir coisas tem. Realizar a vida passou a ser, acredito que depois da obsolescência programada criada pelos americanos, um simples cálculo financeiro em que está realizado apenas aquele que juntou e descartou mais coisas do que a média. E apenas é isso, um cálculo que descarta como  realizado quem consumiu na média ou abaixo dela. Ultimamente agravamos isso, pois agora mesmo que alguém tenha feito isto a vida toda, se ao final dela já não tem ou perdeu o estímulo do simples juntar e descartar, não apenas está, mas é um fracassado.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Sociedade e hipocrisia, quando uma largará a mão da outra?

Publicado em 23/5, editei o artigo em 15 de Junho.
O Brasil resolveu endurecer o combate aos viciados. Sim, aos dependentes. Os traficantes obviamente sempre existiram e provavelmente sempre existirão, é uma questão de demanda, o ser humano sempre forneceu demanda, provavelmente sempre demandará. Mas o Brasil -você, eu, papai, mamãe, tua tia aí do lado- resolveu estampar uma bandeira longa como uma faixa, onde se lê: Sou hipócrita e burro ao mesmo tempo, não quero pensar, apenas enfio minha cabeça na toca e tudo parece bem.
Enquanto o Brasil -nós- endurece o combate às drogas que consideramos ilegais a cerveja será vendida dentro de estádios e a seleção brasileira de futebol será uma representante da ganância sobrepujando a inteligência.
No que se refere ao transporte 'coletivo'. É uma grande vergonha cobrar de alguém para que o indivíduo vá até um lugar servir um babaca que enche o rabo de dinheiro sem se importar com quem o sustenta. Se você é empresário, toma vergonha, se reúne com o povo que te sustenta trabalhando diariamente na empresa e cobra do governo melhora e isenção no transporte público. Se o governo não vê isso, é porque o empresário é conivente. Afinal meu caro, ser empresário é primeiro ser uma ponte entre uma necessidade e uma solução, mexe essa bunda.
A vida anda assim, talvez como desde sempre, só que agora os bois tem nome e as coisas também, não dá mais pra fazer de conta que está bem. Senadores e Deputados obviamente são patrocinados demais para mudar esse rumo, defendem ideias afastadas do bem comum. Ao que parece o poder judiciário brasileiro julga por semântica, se o indivíduo ou empresa tem dinheiro, consegue escapar na base do 'mas o que eu quis dizer é outra coisa...' e as coisas se resolvem. No executivo precisaríamos contratar mais profissionais do que amigos e parentes para fazer as coisas de forma mais -sendo redundante- profissionais. A presidenta Dilma, chefe executiva da nação, tem poder para desfazer isso, mas não creio que ela tenha levado consigo nem inteligência nem coragem para tanto.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Minha solidez é líquida


olhei uma foto
uma exclamação
o mar eu vi


tempo de reiterar a escolha
manter meus sonhos junto ao corpo


sonhei um verão
um banho
a praia imaginei


fazer deste querer o litoral
meu modo na existência


senti a água
a respiração
o toque de voltar


minha solidez é líquida
meu repouso é Atlântico


sábado, 18 de maio de 2013

Carroceiro estivador - No mundo das coisas

Meu problema é juntar coisas. Vivo a juntar mais do que de fato quero, desejo. Junto coisas, um catador de memórias provido de seu infinito rascunho e um oceano de tinta para canetas. E atulhado de coisas já não me vejo, nem ademais me reconheço. Junto inúmeras coisas. Depois jogo fora.
Muito mais do que havia é o que vai. As coisas jogadas fora, em cada novo agora, sempre parecem menos do que tudo que foi fora. Falta razão em pensar assim, mas esse é um sentimento e como tal só faz sentido desprovido de lógica. Fica pálido de sentidos o campo que estava cheio, nem força tem para ser árido. Deixei vazio. 
Mas a vida me revela. Silente e fria no seu impassivo propósito de me refazer, a vida limpa a superfície do espelho que leva para o fundo do casulo onde estou. Dona de si, portanto diferente de mim, redesenha meu destino a seu tempo, seja um dia, hora, ano. Sem as coisas que havia juntado e jogado fora penso ser aquele que é sem espaço para coisas juntadas. Mas a vida persiste e me desengana, abre espaços. Pois é sempre esse sempre, quando estou vazio retorno a mim mesmo. Junto coisas.

domingo, 12 de maio de 2013

Desentraves - Resumo e Discuso


  • Resumo

Arrumei a janela do quarto. Já deixava sempre aberta. Fechar era fácil. Enroscava para abrir. Todos os dias a mesma chatice. Praguejei o trilho. Está arrumada. Desmontei e apertei um parafuso. Ele descia e travava a roldana. Ficou quase perfeita. Deixei aberta. Em breve precisaria mexer lá. Choveu. Pude fechar sem medo. Quando quiser abro. Estou livre.


  • Discurso

Choveu muito, mesmo demais, chuva a sério, acredite. Chuva dessas de verão que quando começam passam rápido e molham muito. Essa era uma chuva de verão com crise de identidade, demorou a passar, achava que era de inverno. Mas só no tempo, na intensidade muita água, de verão mesmo.E a janela lá,  aberta. Eu nunca tive problemas com essa janela, meu desamor era com o trilho, sempre culpei o trilho. Olhava para ele e desfazia até o jeito que fizeram a janela, não pela janela, pelo trilho.
Sempre que acontecia isso, a chuva, se era dessas que pensam que são inverno sendo verão, pior se houvesse vento porque sem vento eu nem iria, se eu lembrasse é claro, corria para fechar a janela. Ela fechava. Assim, era feliz com chuva e frio, porque a janela fechava. Mas quando parava a chuva e voltava o calor... abrir a janela, ela não queria, ou não conseguia. Boa janela, mas o trilho, enroscava, sempre enroscava. Às vezes travava a janela a meio caminho, ficava atravessada, nem ia nem vinha. Prensada entre a parte superior do quadro e ele, o trilho, o traste do trilho.
Suor de molhar a ribana da gola da camiseta. Desmontei a janela, só para ver o trilho, que emperrava e eu não via o porque de um trilho que não passava de um perfil de alumínio quadrado sem arestas, emperrar. A meio caminho já nem queria mais ver o trilho, pensava em outro, comprar outro, fazer outro, criar outro, solicitar uma pesquisa endoutorada da universidade para encontrar o paradoxo do trilho que não serve para trilhar. Quase cai um parafuso, não do trilho, mas dos fixadores da roldana, do quadro de vidro da janela, que corre sobre o trilho. Ele descia e enroscava no agora inocente e antes infernal trilho.
Agora se chove fecho e se o sol aquece, abro. Saindo do trilho fiquei livre.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Ignorância acadêmica

Conheço inúmeras pessoas com bastante conhecimento, diz-se delas que são cultas. Conheço muitas pessoas que falam pobrema. Conheço poucas pessoas cultas com alguma sabedoria. A ignorância, por outro lado, também não produz muito mais do que dificuldades em nos compreendermos.

Dizer prástico não causa pobremas maiores do que dificuldades na compreensão. O culto compreende uma frase quando ela possui um pobrema inserido. Assim como um ignorante compreende uma frase culta quando ela não está carregada de verborragia ou falso saber.

Transmitir o conhecimento, repartir, é um passo que deveria ser natural no caminho do avanço e do saber. A Academia se julga sabedora, infelizmente me parece, cada vez mais e apenas, conhecedora e compiladora verborrágica. A minha alegria é enxergar pessoas que falam que o pobrema não se resolve quando aprendemos a falar problema, mas sim quando deixamos de causá-los, aprendemos a interpretá-los, agimos para resolvê-los ou ultrapassá-los sem deixar que seus rastros sejam uma maldita herança. Qualquer ignorante pode ter essa sabedoria.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Intervalos - 2


A cada espaço que se cria, e digo cria-se a si mesmo, penso que o preenchimento é o passo natural.

Quase nunca haverá mais do que uma vírgula necessária para preencher novos espaços.

O vazio parece ser o complemento que mais preenche.

Aqui está uma vírgula.

sábado, 27 de abril de 2013

Sem semântica

Enquanto, no mundo todo, a maioria das pessoas acreditar que a qualidade das suas vidas, no presente e no futuro, é assegurada pelo dinheiro, viveremos numa humanidade de horizonte ruim, desonesta, superficial. O dinheiro é apenas a menor das relações, um instrumento para trocarmos um valor efetivamente produzido por outro valor. Todos os outros atributos dados a ele são engôdos, mentiras criadas para satisfazer e justificar desonestidades.
Quando a maioria das pessoas compreender que a qualidade das suas vidas, no presente e no futuro, pode ser assegurada pela honestidade das suas relações pessoais, viveremos numa humanidade de horizonte bom, correto, amplo. As pessoais são a maior das relações, são um instrumento para trocarmos abundâncias inerentes a nossa existência. Todos os atributos dados a elas são aprendizados, compreensões transmitidas para satisfazer e justificar fraternidades.
Onde o dinheiro vem primeiro, a fraternidade raramente anda. Onde a fraternidade vem primeiro, o dinheiro tem apenas a importância da disponibilidade
Quem decide por um, negligencia o outro.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

antever

Quando olho para o ar

esse que não se vê

e creio nele haver a lua

luminosa e cheia

sinto o que só se crê.

sábado, 20 de abril de 2013

Sobre a resignação

Ao que passa, o tempo, deixando nossos viços mais escassos, vejo-nos em reflexo. Para tanto somos quase um mesmo, se não ser, pelo menos caminho. Alguns que optam pelo profundo me agradam. Assim dual me escolho diariamente entre ficar velho ou ridículo.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Asas nos pés

Sê rebelde passarinho.
Anda!
Liberta-te dessa prisão.
Lê um livro, saiba um livro.
Sonha!
Lê um livro, saiba um livro.
Liberta-te dessa prisão.
Anda!
Sê rebelde passarinho.
Ensina os homens a voar.

sábado, 2 de março de 2013

Geanine, menina!

"...e então, ainda com o coração batendo forte pela última queda, sorriso e apreensão na mesma face, já sabendo que outra queda chegaria a qualquer momento, ansiava com os braços abertos de quem se lança com o medo, ou seja, acompanhada dele, coragem em dobro, cinco anos apenas, mantinha-se sentada na planta dos meus pés e fitava meus olhos querendo adivinhar o momento em que a soltaria em queda livre, era novamente surpreendida, novamente a suspendia, quase em êxtase descia daquele metro de altura que minhas pernas alcançavam apoiadas pelo corpo deitado sobre as costas, gargalhava e logo se desafiava novamente, vencendo a apreensão da nova queda, buscando adivinhar o momento antes de ser surpreendida, vivia cada ciclo intensamente..."

(recorte de memórias da infância de uma menina amada e feliz)

sexta-feira, 1 de março de 2013

cores e multinós - corujinhas macrame

(revisado)
Estou em 2020, entre a foto e hoje há tempo, onze anos... Em 2009 comecei a criar esse conjunto. Nenhuma delas me fitou da mesma forma, todas sublimaram meus imperativos e afirmaram sua personalidade. Superlativo? Não creio. Todas, antes de receberem o espelho de suas almas, me levaram tempo, que ao contrário do que pensam os tolos não é dinheiro e sim, vida. Em nenhum outro momento, da minha, expressei tão intimamente um ser que me habita e sem pudor se reconhece um artesão que faz arte. Me reconheci por esses olhos, me vi intimamente a partir deles.

Corujinhas - quadro em cores
Painel com trabalhos em macramé, artesanato autoral em fio encerado e fio parafinado. Os olhos são de sementes, vidro, cortiça de rolha... Corujas com média de 5cm afora o rabo, 12 metros de fio, 9 a 14 horas de trabalho.
Foto: Carlos Hirschmann Almeida (obrigado pelo paciente registro e amizade) - Fernando MDB


Quando morava em Cruz Alta e frequentava, nem sempre estudei, o colégio Gabriel Miranda, ainda oitava série, aprendi a fazer macramé. Aqui uma confissão, amo de tal modo essa arte, sou tão seletivo nos momentos em que me dedico a ela, que se não tivesse aprendido a fazer mais nada na vida, apenas a ordenar nós em formas, fecharia meus olhos num final feliz.

Nesse painel uma coletânea de vinte e quatro corujinhas, representam quase trezentas horas de trabalho. Cada confecção trouxe um lampejo de consciência. Nenhuma delas mereceu uma plaquinha de produto finalizado, para mim, todas nasceram, muitas voaram.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

O espelho entre parênteses



Você está velho.

Se é mulher ou homem, não importa. Está ou vai ficar lentamente gordo barrigudo ou magro tripa seca.

Isso significa que o tempo passou e te deixou de presente a idade. Você é biologicamente velho. Isso aconteceu quando você começou a negar que está velho. Aconteceria de qualquer forma. Provavelmente você está ou vai ficar fisicamente deformado e debilitado.

Isso também significa que viveu bastante. Mais do que o tempo em que o corpo jovem se recupera de tudo.

Você está velho.

E pode viver com vigor.

Pode viver sem ser um velho chato, egoísta, medíocre, tacanho, ridículo, covarde... se aceitar isso de estar velho como, apenas, uma limitação física e usar o tempo vivido não como um peso carregado, mas como uma força adquirida com o saber retirado da experiência de vida.

Você está velho, está vivo.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Você é meu verbo amar!

Quero encontrar no finito acordar
e em todas as manhãs que seguem o sol
o que súbito conheci
quando já aceitava viver com sonhos menores
Vigio cada noite como quem vela o sono,
desejando que sejam eternas no renascer diário
a alegria, a beleza, a paz de ser e estar vivo,
a vontade, a gentileza, a força de mover os sonhos,
a esperança, a delicadeza, a atenção dada a cada passo seguido,
a intangível grandeza que você me deu naquele dia,
levando-me para um novo significado e lugar,
quando sorriu uma face chamada amor
numa janela que se abria
tão indescritível e poética.
Quando minhas auroras terminarem
levando por fim os restos do que fui
encontrado o que conheci em ti
para quem permanecer com sonhos vivos
em que manhãs sejam poesia
meu ser será então imaterialmente vivo
relembrando a maravilha da tua eterna existência.


Poema inspirado num comentário para ela:
Quero encontrar em todas as manhãs, a alegria, a beleza, a paz, a vontade, a gentileza, a força, a esperança, a delicadeza, a atenção, a intangível grandeza que você me deu nesse dia, quando me sorriu uma face chamada amor tão indescritível e poética. Você é meu verbo amar!

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Abandonando o navio

Ando cansado, muito. Não de hoje, mas especialmente nesses dias. Há muito sinto um peso agarrado aos ombros, como um punhado de braços que lançam mãos firmes e decididas a manter o peso como lastro. De cansado, querendo dizer o que mais seja verdade, quase não ando.
E é de ser que cansei. Não de ser o que sou, mas de não ser o que intimamente sou. E sou como muitos que nunca serão mais do que uma proposta ou promessa, então não é de prometidos que cansei. Há um mundo desencontrado que me faz cansar de ser. Um se saber não ser, um menos do que o porvir, talvez quase um devir, esse nem bem sim, nem bem não.
Quando abandonar essa Nau que não piloto, que não comando, que não levo a singrar as águas que miro, descansarei. Por certo que sim, descansarei inclusive de ser. A bandeirola da Nau é o que pesa nela, essa paradoxal bandeira pirata, avessa, livre, num mundo de fétidos piratas, avessos e sempre livres. Quero que a Nau, se eu não puder dela, me abandone.
Aos poucos, quando deixo de ser, dou movimento ao verbo abandonar. Quando ele for gerúndio começarei a sorrir um futuro que aceitará com maior afeição o projeto vida. Sem ser, sem lutas, sem bandeiras, sem esperas, sem cadeias.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Tergiversando na madrugada


Tergiversando na madrugada, entre colar etiquetas e repensar os propósitos.

A indústria se especializou, infelizmente e somente em baixar custos para aumentar lucros. Ótimo evoluir, péssimo não utilizar para melhorar a vida todo conhecimento e evolução. O ser humano faz a indústria, o barco é o mesmo.

A especialização é uma arapuca. Para especializar-se o estudioso necessita imperativamente aceitar pressupostos como verdades no mínimo tangíveis. Isso é um funil, especializar-se. Pois bem, quanto mais avança, mais fechado o funil, mais pressupostos aceitos. Poucos continuam a olhar para o lada do funil em que a boca é larga.

Acreditar, falsamente, que baixar custos é escolha motivada pela disseminação do acesso a um produto é um pressuposto. É falso. A indústria baixa custos para aumentar lucro. O consumidor é enganado pela indústria para não pensar que está sendo enganado quando a indústria baixa a qualidade dos produtos numa escala diretamente ligada a baixa dos custos de matérias-prima, e não somente custos de imagem.

Especializar-se é demorado, só é caro para quem aceita o pressuposto, falso, de que tempo 'vivido' também é dinheiro.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Simples


Enquanto a vida segue, movimento é gerúndio.
Viver parado nem por um segundo é possível.
Assim vemos as coisas pelas quais passamos e também as que passam.
Entre essas coisas estão as pessoas.
Só as essências fogem às regras.

Foto por Irene Silveira

Vasto como som
Inaudível como o espaço
Certo como o irreconhecido
Habita em ti um ser chamado Amo

Imaterial como o vento
Perceptível como a água
Dúbio como o pensamento
Habita em ti um ser chamado Amo

O Amo que me habita é meu.

Mínimo como o silêncio
Audível como o eco
Incerto como o sabido
Habita em ti um ser chamado Sou

Sólido como o ar que não passa
Intátil como a partícula
Definitivo como o nada
Habita em ti um ser chamado Sou

O Sou que me habita é teu.

Inerências retóricas

escrito e dinâmico * A razão é a busca dela. Está sempre entre seu impulso e sua descoberta. ..............................